quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

quando

Quando o futuro chegar
E o passo estiver no chão
E virar os sapatos dos pés
Pelas mãos

Vai ser então quando
Dissermos agora
Na hora
em que a festa virá

Virar o ano e o amor
Estará nos meus planos
Quando eu voltar a tocar
O piano
Virá a siesta e a sexta
e pelas noites seresta

Vão dedurar minha sorte
Afiarão os dedos
ressuscitando cortes

Mas assim mesmo só quando
Alguem verá que eu ando
Andorinhando em verão
Armando solo em sustenido
Então suspenso no ar
Chico Buarque cantando
em um sussurro gemido

To me guardando pra quando
o carnaval chegar

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

para não

Para não
perder
se em
transe
abrace
a tontura

Para não voar,
na fissura
o chão

Para não
correr
o risco
da palavra
pura
mente
dura,

Para durar,
aprender o não.

Disfarce a flor
na doçura
de um alface.
puxe a cor
que toda superficie
costura

como gente
que em vão
não se esquece
para não
parar
o coração

Enlace.

domingo, 10 de outubro de 2010

a ordem das coisas

No cartório está descrito
Marcado no concreto do escrito:
Nascimento, casamento, Morte.

Ora mas que sorte!
A ordem das coisas
já fixou seu norte?

Nascer, crescer, envelhecer...
E se quiser rebubinar a fita?
A vida, uma linha torta,
embolada, infinita,
que importa?!
É de deixar aflita!
Começar morta,
se já antecipam a escrita.

Deixem o acaso escrever.
Amar, nascer, envelhecer e casar
antes do encontro, e ter um caso,
um flho e um nome,
um brilho no olho do homem.

Que delícia o vai e vem!
Saber logo na saída
qual era o fluxo do trem.

Afinal aquela escala,
sistema métrico de história
veio de quem?
qual memória?

que delícia a desordem!
os incomodados
que se mudem.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Grãos

Grãos
De afeto refeito
Certos desse circo
Sem jeito
Em querer perto.
Aperta no peito
Circulo de concreto
É defeito
Dor-objeto.
Não digo mais
Não
A não ser
Se não me deres
As mãos
Gotas
Dágua dura
Pingam na pedra
De um coração
Em pirraça
Birra pura,
Não disfarça
Me caça, me cura
Feito atadura
Encaixe perfeito
Me abraça.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

fantasia



Eu quero me arrepender.

tropeçar nas boas maneiras
se estabacar nas calçadas

aparecer a calcinha

ser apontada
na rua 
e desdizer
o rubro às bochechas
que escreve na testa.

Perder, gastar borracha,
riscar as cartas de amor
- quando já se tiverem enviado!
ridícula, esmurrar a parede,
tremer o corpo, rasgar,

rasgar, rasgar, 
rasgar
o arrependimento
bêbado,

entre pernas de palavras alheias,

sóbrio,
entrelinhas 
malditas
de quem enxerga demais.

Sou mais escrever com as secreções
deste destino escroto,
que chorar no escuro e secreto.
Sou mais a vida
dos fatos malfalados
do que das falas fadadas
a nada.

E desse desprendimento
sem pudor, corrimento
de memória, fica cicatriz
no corredor de esquecimento.
Arrepender-se com dor
para marcar a história.
Arrepender-me sem
arrependimento.

domingo, 8 de agosto de 2010

adulta

estou aprendendo:
é preciso abrir os livros,
senão eles mofam.
é preciso regar as plantas,
se não elas morrem.
é preciso sorrir,
se não esquecemos.

é preciso cuidar, a cada ato,
que, se deixar depositar ferrugem
nas articulações do tempo,
não reimprimem os livros
não ressucitam as plantas
não volta atrás, é irreversível.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

gangorra

Eu não quero pensar
na hora da minha morte.
- eu penso.
Eu não quero
futucar o corte
- eu tento.
Mas um rosto, que se perde
é mais um porto,
eu sem norte.

- eu parto.
Eu não peço.
Mas se eu não esqueço
marcou sem precisar tatuagem.
Eu não quero seguir viagem
- bobagem.

não quero a vida sempre
história curta de primeiro ato.
não quero a fuga, a saída amiga
- eu queria ser formiga.

desato os nós
e as outras pessoas-plurais.
a vontade segue assim
dias menos
dias mais.

noturnos

O escuro estica os lensóis
no infinito da cama
inflamando, fio a fio
até que a noite me chama.

Sussurra impuro,
imprudente, obscuro.
demora, reclama
o colchão é duro...

Não há nesta noite
um homem decente
que não entorte a verdade
no teste entre os dentes.

De barriga cheia
e alma vazia
sem nome essa gente
infame, a fama.

Um tiro sem furo
na fome procuro
até que o leite
derrama.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Como procurar?

Como procurar
O objeto sem forma
E sem cor?
Será furta, ofuscará
A dor de morder a fruta?

Como acostumar a vista
Pro que o olho nao alcansa?
Estará entre as revistas,
Na novela, no bar, na dança?

Comparam no verso com flor.
Com fel e com fado e com sina.
Dizem que é coisa de mulher.
Dizem que é coisa de menina.

Invisivel, esta procura que rima,
Que deixa o olhar abestado
Sem enxergar o que está
mesmo ao lado.
Sentimento sem face, eterna fase,
Não tem frase que o determina.

Aflição humana, redenção divina,
Deus nos acuda,   
Já o Google nao ajuda
a procurar,
Ponha-se na lupa
aquilo que está como ar:
uma pista é amor;
infinitivo, amar.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

poema quase funk

A unha cresce
A fruta apodrece
Ai se eu soubesse
O processo é esse

A gente amando
Não se aborrece
O tempo manda
a fila anda.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

passou

O dia passou

A noite alcansou

Cansou, insistiu

Pediu, perdeu

Resistiu, cegou
...
Matou e morreu ou

Nunca chegou?


Ou fui eu

Quem piscou?

vontade

O Dia Não
Passa A Tarde
Na Mão Passaros
Vão Voando
Sao Dois Esperando
A Luz Rouca
Mais Vale Estar
Só Do Que São
Três Da Tarde
O Dia Me Arde
Vontade Louca De
Grão em Grão
Mas Valerão Se
Esticar Sem Alarde
Uma Noite
Ao Alcance Da
Boca

domingo, 25 de julho de 2010

Aparição

Enxergo teu nome
Atravessado na pista
Trincado num sinal de pare,
Sinal de que engana a vista.

Teu nome,
Um grande trem
descarrilhando lentamente
a cada silaba
E a vogal nao mente
Enquanto a consoante
sibila intermitente.

Teu nome invadindo
Materias de jornal
Igual lembranças impressas
Na pressa do borrão

Não!
Apariçao mal quista, mal
Improvisada, Miope, usada.
Peça de memoria imprevista.
Caligrafia malvada! Danação!

No meio da neblina
No baralho das palavras
Na invençao confusa
das esquinas
Alucinando teu nome,
Homem.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Pergunta

Esquerda ou direita
Qual será a certa?
Na curva sem seta
que dúvida a espreita?

Esperta ou estreita?
Acorda ou se deita?
Embora ou espera?
Revolta ou aceita?

De dia ou de Noite?
Ficou ou ja foi-se?
Tem medo da vida
E também da foice...

Não sabe se casa
Ou se bicicleta
Segura ou deixa
se saber sem meta?

Incerta em desejo
Não sabe se o eixo
acertando o prumo
é tão linha reta.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

meias verdes

Se eu sigo contando
pedrinhas no chão
"maria-joão-maria-joão"
é que perdi meus caminhos
meu ninho, meu nicho.

Os camaradas que restaram,
minhas migalhas de pão,
eu conto nos dedos.
Eu tenho virado bicho.

E o coração,
como um tendão de Aquiles
quase que esmigalha!

Enquanto eu não perco a batalha,
fantasio em versos
(universos cor-de-rosa)
que a verdadeira falha
tem sido usar meias verdes.

Quando a bainha descortina
moleca, coisa de menina,
minhas meias verdas à mostra
eu desatino
pateticamente exposta.

Deve ser isso.
Deve ser isso.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

turvo

Eu confundo
a sede com a fome
a fome com medo
o medo com teu nome.

Eu perco, sempre,
infame. Sem saber onde
o pé alcansa e quanto
um peixe consome.

As carpas, as larvas, a lama,
confundo.
É que o fundo some
se o lago
é profundo.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Balão

Eu queria um poema
pequeninodebotão
Um anelquetumedeste,
batatinhapelochao

Um mimo!
Pendurado em cordão
fino, que fizesse levantar

Seu coração que está chão,
Meu coração que é ar.

Contagem

Do primeiro encontro,
ficou um segredo
da lua enchendo
aquele céu seco.

Segundo o encontro
viagem, correndo
sem tempo pra ver
que era sonho.

O terceiro foi risonho...

E agora a emenda
buscando nos cantos
- quem sabe um soneto? -
onde é que te encontro?

Cantando?

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Até logo

Nao fizemos pedidos
Sob as estrelas
Cadentes, fomos
Embora em chamas

Não chamamos
- nos
nús
Secretamente no escuro

Não gozamos
De boa vontade
Não faremos caridade

Não fiquemos à vontade,
Nós mal nos conhecemos.

Como,
se queremos
a Vida acima
de nós mesmos,

mesmo q nós
e os nós que demos
nos deixem sós,
Como podemos?
Não nos amamos

Não juramos
Nem despedimos
Nos despimos
Até logo
Que desprendemos.

Desaprendamos.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Suspiro

Ao segurar o livro
Apoiadas nos cotovelos,
As maos tremiam.

Um murmurio suspeito repetia
No quarto ao lado
A respiraçao ofegante da avó
Deitada

Que falava sozinha com
A garota surda
Como uma porta
Pensava
Que será de mim
Quando faltar o ar para segurar
Um livro, quiçá
Um ...

Caiu com as paginas abertas
No poema de numero 36.
A ambulãncia chegou sem barulho.