segunda-feira, 23 de agosto de 2010

fantasia



Eu quero me arrepender.

tropeçar nas boas maneiras
se estabacar nas calçadas

aparecer a calcinha

ser apontada
na rua 
e desdizer
o rubro às bochechas
que escreve na testa.

Perder, gastar borracha,
riscar as cartas de amor
- quando já se tiverem enviado!
ridícula, esmurrar a parede,
tremer o corpo, rasgar,

rasgar, rasgar, 
rasgar
o arrependimento
bêbado,

entre pernas de palavras alheias,

sóbrio,
entrelinhas 
malditas
de quem enxerga demais.

Sou mais escrever com as secreções
deste destino escroto,
que chorar no escuro e secreto.
Sou mais a vida
dos fatos malfalados
do que das falas fadadas
a nada.

E desse desprendimento
sem pudor, corrimento
de memória, fica cicatriz
no corredor de esquecimento.
Arrepender-se com dor
para marcar a história.
Arrepender-me sem
arrependimento.

domingo, 8 de agosto de 2010

adulta

estou aprendendo:
é preciso abrir os livros,
senão eles mofam.
é preciso regar as plantas,
se não elas morrem.
é preciso sorrir,
se não esquecemos.

é preciso cuidar, a cada ato,
que, se deixar depositar ferrugem
nas articulações do tempo,
não reimprimem os livros
não ressucitam as plantas
não volta atrás, é irreversível.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

gangorra

Eu não quero pensar
na hora da minha morte.
- eu penso.
Eu não quero
futucar o corte
- eu tento.
Mas um rosto, que se perde
é mais um porto,
eu sem norte.

- eu parto.
Eu não peço.
Mas se eu não esqueço
marcou sem precisar tatuagem.
Eu não quero seguir viagem
- bobagem.

não quero a vida sempre
história curta de primeiro ato.
não quero a fuga, a saída amiga
- eu queria ser formiga.

desato os nós
e as outras pessoas-plurais.
a vontade segue assim
dias menos
dias mais.

noturnos

O escuro estica os lensóis
no infinito da cama
inflamando, fio a fio
até que a noite me chama.

Sussurra impuro,
imprudente, obscuro.
demora, reclama
o colchão é duro...

Não há nesta noite
um homem decente
que não entorte a verdade
no teste entre os dentes.

De barriga cheia
e alma vazia
sem nome essa gente
infame, a fama.

Um tiro sem furo
na fome procuro
até que o leite
derrama.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Como procurar?

Como procurar
O objeto sem forma
E sem cor?
Será furta, ofuscará
A dor de morder a fruta?

Como acostumar a vista
Pro que o olho nao alcansa?
Estará entre as revistas,
Na novela, no bar, na dança?

Comparam no verso com flor.
Com fel e com fado e com sina.
Dizem que é coisa de mulher.
Dizem que é coisa de menina.

Invisivel, esta procura que rima,
Que deixa o olhar abestado
Sem enxergar o que está
mesmo ao lado.
Sentimento sem face, eterna fase,
Não tem frase que o determina.

Aflição humana, redenção divina,
Deus nos acuda,   
Já o Google nao ajuda
a procurar,
Ponha-se na lupa
aquilo que está como ar:
uma pista é amor;
infinitivo, amar.